terça-feira, 30 de junho de 2020

“De certo modo, é mais fácil escrever para adultos do que para crianças”



Decidiu o caminho profissional atirando uma moeda ao ar, esteve presa em Caxias antes do 25 de Abril e valoriza o humor como filosofia de vida. Saramago foi o grande responsável pela sua entrada no mundo da literatura infantojuvenil. Luísa Ducla Soares comemora 50 anos de vida literária, contabilizando cerca de 180 obras publicadas que criaram gerações de pequenos (e grandes) leitores.


Máquina literária formidável, de sua graça Maria Luísa Bliebernicht Ducla Soares de Sottomayor Cardia, 80 anos, espírito jovem e bom humor constante, viu as comemorações dos 50 anos de vida literária interrompidas pela Covid-19. Sem crise: a escritora lisboeta multipremiada, admirada como referência maior da literatura infantojuvenil, formada em Filologia Germânica, que começou carreira como tradutora e jornalista e trabalhou 30 anos na Biblioteca Nacional, continua sem mãos a medir. Ele é poemas para a peça musical O Carnaval dos Animais, de Saint-Saëns (projeto do Conservatório Nacional), ele é projetos novos a saírem (histórias da sua vida para crianças, um volume de contos tradicionais e provérbios feito com o Museu Bordalo Pinheiro), ele é ainda uma obra com o músico Daniel Completo, a exposição Luísa Ducla Soares: com sonhos e livros se constrói a vida (dedicada à sua obra, na Biblioteca Nacional) e até um poema sobre o coronavírus, que lhe apareceu “na ponta do lápis” e que Pedro da Silva Martins anda a musicar. Mãe de um jurista e de uma especialista em marketing, avó de quatro netos, Luísa Ducla Soares vive como um poema contínuo.
Um convite para escrever tem sempre um sim seu?
Não, até porque há projetos que não me interessam nada. Escrever dá trabalho, não é só carregar num botão e temos um texto. Mas, por exemplo, há dias escrevi um poema sobre o coronavírus, é o que estamos a viver. 

O seu primeiro livro, Contrato (1970), foi de poesia. Estes 50 anos de escrita poderiam ter sido dedicados a outro género literário?

Nunca por nunca pensei em dedicar-me, sobretudo, à literatura infantil. Imaginei que iria escrever romances, poesia, contos e tal. Mas eu inventava histórias para crianças desde os 13 anos. Tenho um irmão dez anos mais novo e tomava conta dele muitas vezes. Era um miúdo reguila, esperto e inventivo, mas fazia muitos disparates. Pensei: “E se eu lhe contasse histórias?” Comecei a ler-lhe uns livros que tínhamos lá em casa, mas ele achava aqueles heróis aborrecidos. Então, inventei uns heróis à maneira dele, diabólicos, estranhos, divertidos. E ele gostava tanto que não me deixava mudar de história. Eram uma espécie de telenovelas: uma dessas histórias durou três anos.

Era uma Sherazade, portanto? 
 
Uma Sherazade de trazer por casa. Escrevia desde os 10 anos, publiquei as primeiras coisas no jornal do Liceu Francês e fiz sempre muita poesia. E tive a sorte de ter vários colegas que viriam a ser escritores. A Fiama Hasse Pais Brandão foi a minha maior amiga de juventude no liceu: estávamos numa sala de aula com 16 alunas, e ela era a única que também gostava de escrever. Na Faculdade de Letras de Lisboa, tornei-me amiga da Luiza Neto Jorge, do Gastão Cruz, da Maria Teresa Horta… Fizemos juntos a GRAFIA [publicação pró-Associação de Letras] e, depois, eles quiseram criar o grupo Poesia 61 [dedicado à renovação poética]. Mas eu senti que havia uma quebra entre a minha maneira de encarar o mundo e, sobretudo, a do Gastão Cruz: ele fazia ao José Régio o que o Almada fez ao Dantas, “pim pam pum!”. E eu não aceitei isso. Pensei: “O José Régio, no fim, é muito melhor poeta do que tu.” Continuámos amigos mas eu não entrei no Poesia 61. De certa maneira, isso prejudicou-me: era um grupo que dava saltinhos para o surrealismo, neorrealismo, experiências diversas… 

E como surge a literatura infantil?

Um dia, por desfastio, apeteceu-me escrever um livro para crianças: A História da Papoila (1973). Não conhecia editoras de literatura infantil e fui aos Estúdios Cor. Quem lá estava era o [José] Saramago, homem que eu não conhecia de parte alguma, pessoa reservada, de pouca conversa. Ele disse-me: “Deixe aí o original e venha cá daqui a um mês.” Pensei: “Bem, ele não parecia nada interessado, vai dar-me uma nega…” Mas ele respondeu-me: “Olhe, gostei muito do seu livro, já arranjei ilustrador e vamos publicá-lo.” Quando a história saiu, para nossa sorte ou azar, o regime quis atribuir-nos o Prémio Maria Amália Vaz de Carvalho, e nós recusámos. O Saramago disse-me: “Luísa, fez muito bem em não aceitar o prémio.” A partir daí, ficou meu amigo e pediu-me mais seis livros para crianças para publicar no ano seguinte. E eu pensei: “Este homem tem a mania da grandeza! Eu comecei isto por brincadeira, mas… porque é que não os hei de fazer?”. E foi Saramago o responsável por eu ser escritora de literatura infantil. Escrevi os seis livros, interessei-me pelo género, comecei a ter desafios, a sentir que aquilo tinha um sentido na minha vida. E, entretanto, os meus filhos nasceram, interlocutores a quem esses livros podiam estar destinados.
O que lhe trouxe a escrita de livros infantis?
Para já, muitas discussões domésticas. O meu marido [o político e professor universitário Mário Sottomayor Cardia, 1941-2006] era um purista da língua, um homem que refazia vinte vezes o que escrevia. Ele apreciava muito os meu poemas, mas disse-me que dedicar-me à literatura infantil era “deitar pérolas a porcos”: “Estás a desperdiçar o teu talento com isso, estás a dar cabo da tua vida, podias ser uma autora conhecida e singrares, estás a meter-te numa cova funda que não te leva a parte nenhuma, ficas aí entregue às criancinhas…” Mas eu comecei a pensar que as criancinhas também precisavam de gostar das palavras, de perceber o seu significado e de ter, desde cedo, gosto pela literatura.

Sentiu o preconceito de não ser a “grande romancista/poetisa”?

Isso passou-me ao lado. Estava a fazer algo de que gosto e que é importante que seja feito. Nas Cartas de Inglaterra, o Eça de Queirós fala sobre a literatura de Natal britânica e que nada tinha que ver com a nossa literatura para crianças da época: uma chatice de biografias de heróis, uns meio santos, com histórias deturpadas ou tristes que ele próprio ridicularizou nos romances. Eça diz que seria um favor extraordinário à pátria se as senhoras inteligentes mas pobres se dedicassem a fazer livros para crianças. Ele reconhecia a necessidade, mas achava que não era preciso grande talento. Horroroso, não é? Mas o que é certo é que os autores mais marcantes da sua geração escreveram livros para crianças: Antero de Quental, Pinheiro Chagas, Guerra Junqueiro, Gomes Leal… De certa maneira, Eça foi um impulsionador da literatura infantil. O que me importa a mim que achem que é uma porcaria eu estar a escrever para crianças? Nada! Há autores de grande nível a escreverem literatura para adultos; eu própria gostaria de o fazer, mas não tenho tempo para tudo. E escrever para crianças também obriga a muita disciplina mental, a fazer escolhas de palavras e de formas de falar. De certo modo, é mais fácil escrever para adultos do que para crianças. 

Porquê?

Porque temos de pensar na maneira de pensar delas, na forma como assimilam as mensagens, nas histórias que contamos, nas palavras. Um estudo inglês mostrou que, há uns anos, as crianças tinham um vocabulário até quatro mil palavras. Hoje, estão reduzidas a duas mil, e só usam duzentas. Com os computadores isso piorou, porque agora comunicam por smiles e emojis. Nem sei se algum dia eu farei um poema com emojis metidos no meio… Não devemos degradar a literatura infantil, infantilizando-a. Mas há que ter o bom senso de não introduzir demasiadas palavras que uma criança não compreenda. 

Com cerca de 180 obras editadas, como avalia o seu contributo? 

Se quer que lhe diga, nunca pensei em nada teórico sobre esse assunto. Tenho procurado abordar temas que considero interessantes para as crianças e transmitir-lhes determinados valores, como o conhecimento da língua, o desenvolvimento da imaginação e da criatividade. Não tenho uma missão literária com objetivos específicos. Impingir catecismos aos miúdos é a coisa mais desastrada. Mas, sempre que possível, tenho procurado ligar o humor às coisas sérias. Porque o humor faz muita falta: se encaramos tudo seriamente, a vida torna-se chata, português suave, monótona. Mas tenho uma ideia condutora: fazer aquilo que me apetece em cada dia, e que tem que ver com o que está a acontecer à minha volta. Não vou falar diretamente na situação política, embora tenha livros sobre o racismo, a guerra, o bullying, as migrações… Mas coloco esses temas no meio de outros, para que sejam elas a descobrir a mensagem existente e a descodificá-la. Não sou eu a dizer: “Olhem, está aqui a moralzinha da história, apanhem isto que é o importante.” 

Em tempos de Covid-19, a leitura pode ser terapêutica?

Bem, há muitos que andam a ler A Peste, do Camus… Cada um lê o que quer. Hoje, falei com um amigo que me contou anedotas bem engraçadas, acabadinhas de sair do forno da imaginação, sobre a Covid-19. A criatividade também vai para aí. Nós não estamos a guardar estas anedotas que, tal como as lengalengas e os trava-línguas, são uma forma de expressão irónica, um saber por vezes esquecido do povo português. 

Que histórias há nas suas estantes?

Eu tinha uma biblioteca brutal, constituída por mais de 80 mil livros de todos os géneros. O meu marido era um bibliófilo: viajava para Inglaterra, França e Itália para visitar alfarrabistas, comprava livros para ler quando um dia tivesse tempo, tinha coleções enormes de jornais literários, científicos, políticos. Eu tenho uma casa grande, um direito e esquerdo que foram ligados, pois os meus sogros moravam ao lado, para os livros caberem… Mas esta biblioteca chegou a um ponto em que partiu as vigas da casa, o chão foi abaixo! Quando o Mário morreu, pensei: “O que vou fazer a tanto livro? Isto é uma coisa mesmo louca. Vou oferecê-los.” E porque os livros também foram a sua vida, dediquei-lhe esse gesto: ofereci mais de 70 mil livros à biblioteca da Universidade Nova-FCSH, que foi rebatizada com o nome do meu marido. Atualmente, tenho pena: tinha tantos livros que eu gostaria de estar a ler, até porque provavelmente vou ficar dois anos metida em casa [risos]. 

Uma outra “biblioteca” importante na sua vida foi o seu pai, o médico Armando Ducla Soares. Sentiu-se tentada a ser médica? 

Exatamente. Quando cheguei ao antigo quinto ano do liceu, gostava muito de ciências e de letras, e não sabia qual das disciplinas devia seguir. Pedi opinião aos meus pais, mas eles não quiseram ser responsáveis pelo meu futuro. Decidi fazer os exames: tive média de 16 a ambas. A dúvida foi cruel, e escolhi o meu rumo de uma forma estúpida que não recomendo a ninguém: atirei uma moeda ao ar. Se calhasse cara, ia para letras; se calhasse coroa, seguia ciências. Saiu cara e fiquei sempre com o desgosto de não ter seguido para ciências. Mas também teria sentido arrependimentos se fosse o oposto. Todos nós encontramos encruzilhadas e temos de decidir entre coisas de que gostamos. Alguns dos meus livros são incursões no futuro escritas para adolescentes, porque gosto de pensar como a Ciência mudaria o mundo.

Crê que é preciso ter tido uma infância feliz para se escrever literatura para os mais jovens?

É mais o contrário: para escrever, é melhor ter tido uma infância infeliz. Porque nos faz pensar mais e acreditar que o papel pode ser um confidente. Uma criança feliz está envolvida nas atividades e amizades, dispersa-se mais; uma criança que se sente infeliz tem, muitas vezes, de procurar no papel a compensação para o que gostaria de ter e não tem. 

Como foi a sua infância?

A minha infância não foi toda feliz. Não me faltou nada: nunca passei fome, nunca fui maltratada, nunca sofri vexames. O meu pai era uma pessoa fantástica, vem dele o meu gosto pelo humor. Foi uma pessoa de esquerda, envolvido em movimentos políticos de resistência e, aos 19 anos, esteve seis meses preso no forte de São Julião da Barra. Tirou o curso de Medicina com dificuldades (era órfão de pai desde os 9 anos, e de mãe aos 17), subiu a pulso e não podia entrar na carreira pública devido aos antecedentes oposicionistas. Ele dizia que nunca poderia ser um bom médico sem ter a tarimba de hospital: de manhã, ia cedíssimo para lá, trabalhando de graça. À tarde, ia para o consultório. E, à noite, estudava. Tinha pouco tempo disponível. “Isto é muito pouco pai para mim”, pensei. Mas aos sábados e domingos, quando o meu pai ia ver doentes a casa, eu ia com ele no carro, conversando e ouvindo-o recitar. Ele sabia muitas poesias de cor, literatura tradicional, lengalengas, toda a espécie de coisas. 

Seguiu-lhe as pisadas ao envolver-se nas manifestações contra o Estado Novo?

Sim, durante as greves académicas de 1962. Fizemos uma manifestação a favor dos alunos que tinham sido expulsos da Universidade de Lisboa e estavam impedidos de concluir os cursos [na sequência das greves de fome, provocadas pela proibição dos festejos estudantis, e das cargas policiais]. Íamos a subir pacificamente a Rua Garrett, no Chiado, com cartazes a defender a integração dos alunos expulsos, e apareceram os pides. Cada um meteu-se onde pôde. Eu refugiei-me na Livraria Sá da Costa, fingi que estava a ver os livros e deixei-me ficar lá uma hora e tal. Quando saí, um pide agarrou-me logo e disse: “Pensavas que eu não te vi entrar? Agora vais já presa.” O malvado levou-me logo para a António Maria Cardoso, e, quando entrei, ele disse a outro agente: “Entra mais um enterro!” 

E aos 22 anos é enviada para Caxias…

Caxias estava apinhada. Ao chegar lá, mandaram-me despir, fiquei nua num corredor. Depois, meteram-me numa cela grande, pintada de branco, que tinha casa de banho com chuveiro. Não era como o pardieiro do Aljube, ou as jaulas com catre da António Maria Cardoso. Dizia-se que estas celas eram para que, quando o regime caísse, estivessem arranjadinhas para os receber [risos]. Fui enviada para uma cela com 19 mulheres, uma delas era a Noémia Delgado, realizadora e mulher do Alexandre O’Neill. Todas as outras eram camponesas alentejanas, presas por lutarem pela semana de oito horas de trabalho. E, nem que passem mil anos, nunca me esquecerei de uma delas: uma viúva que tinha ido à procura do filho de 14 anos, depois do recolher obrigatório imposto pela guarda. Apanhada, foi atingida a tiro na barriga, e os médicos do Hospital de Évora disseram aos filhos para se prepararem para o pior. O que é certo é que ela sobreviveu, mas os filhos, crentes de que a mãe ia morrer, foram comprar-lhe outra saia preta para ela não ser enterrada com uma saia cravada de balas. E ela estava na prisão, vestida com a saia furada e com uma malinha com a roupa nova, para os filhos não terem de comprar nova saia quando ela morresse. 

Quanto tempo esteve presa?

Apenas uns dias, mas era preciso termos rotinas. Eles tinham as casas de banho novas, mas não punham papel higiénico. Serviam em pratos de metal, mas só havia colheres para as pessoas não se poderem suicidar com garfos ou facas. Escrevi, num texto para a agenda anual do IPO, que até numa prisão pode haver asas. Porque os pássaros entravam pela janela, e aquelas mulheres do campo ficavam contentes por os ver. Mas quando os guardas viram que isso era uma forma de resistência e de alegria, proibiram dar de comer aos pássaros e castigavam quem fosse apanhado a fazê-lo. Entre as prisioneiras, havia uma mulher chamada Vitória, e a nossa vingança foi toda a gente chamar por ela a todo o momento: “Vitória, Vitória.” [risos

Que outras histórias guardou de Caxias? 

Dizia-se que estavam lá os participantes da intentona de Beja, anterior ao 25 de Abril, ao nosso lado, e que comunicavam por código Morse. Mas como nós não percebíamos código Morse, nunca conseguimos decifrar nada [risos]. E quando me vim embora, as mulheres da cela pediram-me para trazer recados à família: levei-os na bainha da saia… Nessa altura, fiquei com uma raiva grande ao Alexandre O’Neill, poeta que adoro, mas que, como pessoa, não devia haver mais asqueroso. A Noémia tinha sido presa, de alguma forma por causa dele: uns amigos italianos do O’Neill tinham vindo a Portugal e queriam ver uns bairros de lata. E ele, como não tivera paciência ou disponibilidade, pediu-lhe que fosse ela a mostrar-lhes. Os pides devem ter tido conhecimento daquilo, agarraram nos italianos e puseram-nos no aeroporto, a ela puseram-na em Caxias. Quando fui presa, estava calor e a Noémia só tinha camisolas de gola alta, quentíssimas. Já tinha mandado não sei quantos pedidos de roupa fresca ao marido, e ele não enviava… Resolvi ir conversar com o O’Neill, mas ele não me atendeu. Telefonei ao Urbano [Tavares Rodrigues] a explicar-lhe a situação, e ele, interventivo e sempre a comover-se com as coisas, disse que ia já falar com o O’Neill, coitada da rapariga. Então, o O’Neill tinha arranjado uma nova namorada. Mas isto era uma questão de solidariedade… 

Todos os autores têm um lado negro?

É por isso que eu digo que, às vezes, é muito mau conhecer escritores. As pessoas pensam: “Ah, este homem ou esta mulher escrevem tão bem, têm sido importantes na minha vida, que alegria me trazem, devem ser umas pessoas bestiais.” Se os conhecem, às vezes apanham um balde de água fria. Todos nós temos heterónimos, muitas personagens a viver dentro de nós. A escrever, somos uma dessas personagens. A falar com a família, outra. No emprego, outra ainda. 

A personagem que assinou cerca de 180 obras é trabalhadora…

Tenho contribuído um pouco para o abate das árvores… [risos]. Vou dizer uma coisa péssima: uma biblioteca é uma floresta derrubada. Mas é por uma boa causa.

O que é que ainda a faz escrever?

Tudo. Estamos sempre a ver coisas que valem umas letrinhas.

Uma vida em números 

Luísa Ducla Soares é uma das mais prolíficas autoras da literatura portuguesa

1970
Ano do primeiro livro

Ainda que a escritora tenha começado a escrever aos 10 anos de idade, a sua primeira obra editada, um volume de produção poética intitulado Contrato, chegou às livrarias quando ela tinha 30 anos.

180
Obras à data


A comemorar 50 anos de carreira, são quase duas centenas os livros da sua autoria, de vários géneros, além da literatura infantojuvenil: conto, crónica, drama, ensaio, poesia, tradução, memorialismo…

89
Livros no Plano Nacional de Leitura


A autora tem uma forte presença nesta lista fundamental para jovens leitores e escolas, que inclui, entre muitos outros, A História da Papoila, A Cavalo no Tempo e Poemas da Mentira e da Verdade.



https://visao.sapo.pt/atualidade/cultura/2020-06-27-de-certo-modo-e-mais-facil-escrever-para-adultos-do-que-para-criancas/

sexta-feira, 26 de junho de 2020

MAURÍCIO ANTONINO FERNANDES (1930-2020)






Maurício Antonino Fernandes partiu hoje para a última viagem.

Sentidos pêsames à família!

O Dr. Maurício nasceu em Felgueiras em 1930. Foi professor, investigador de história e genealogista.

Viveu quase toda a sua vida entre Oliveira de Azeméis - onde residia - e S. João da Madeira onde, durante anos, foi professor no Colégio Castilho e na Escola Dr. Serafim Leite (Escola Industrial), tendo criado fortes laços de amizade com os seus alunos e colegas.

Nos anos 60 foi responsável pelo trabalho de inventariação e catalogação dos livros legados à Biblioteca Municipal pelo Sr. José Moreira, referindo no seu relatório a existência de “…obras de grande valor patrimonial e inúmeras edições príncipes..", ou seja, primeiras edições, sendo algumas delas raras.

Escreveu várias obras, mas a que se tornou uma referência para a cidade foi a Monografia que elaborou a pedido no Município, editada em 1966,  designada “S. João da Madeira: cidade do trabalho".

No prefácio dessa obra o Dr. Maurício Fernandes refere que com este convite lhe tinha sido exigida a responsabilidade de "…um trabalho que aprofundasse e complementasse o passado sanjoanense, desde os tempos mais remotos à atualidade…" além do levantamento do Património Sanjoanense, o que o obrigou a “…pesquisas rigorosas documentais em todos os fundos arquivísticos…", o que significou ter ido à fonte desses conhecimentos buscar a informação.

Esta obra veio colmatar as falhas encontradas na primeira Monografia de S. João da Madeira, editada em 1944 e da autoria de Mário Resende Martins (médico), José Fernando de Sousa Teixeira (engº agrónomo) e Manuel Dias da Silva (economista), que ao longo dos tempos tinha esgotado. Nessa época a Monografia tinha sido alvo de críticas diversas. Mas como em História não há documentos definitivos e é uma narrativa em permanente construção, esta primeira Monografia foi e é um contributo importantíssimo para o conhecimento da história de S. João da Madeira.

Na obra do Dr Maurício Fernandes editada, como referido, em 1966, podemos encontrar informação preciosa sobre a origem da toponímia “Madeira” e dos diversos lugares do concelho, bem como uma assombrosa descrição sobre o "alvoroço indescritível" quando, pela primeira vez, "um comboio alcançava S. João da Madeira".

São também diversos os fac-símile dos documentos que nos dão conta das primeiras vendas de terrenos no que é hoje o nosso concelho. Num deles, de 23 de março de 1088, refere que "Agila Godins, neta de Godinho Vimaras, vende a Donadeu Álvares e à sua mulher Truilhe o quinhão que tinha herdado de seu avó, num casal sito na vila de Sancto Ioanne que dicent de Mateira por dois moios de pão".



Lá encontramos as justificações mais variadas das razões para a formação deste povoado, depois da reconquista aos mouros. "Bem posicionada geograficamente, a 20 Km da costa marítima e a 30 km do Porto, assente sobre o dorso maciço de uma airosa colina, arejada do mar e da serra...".


E também a referência ao rio que banhava estas terras e que foi um importante fator para a fixação das populações. Era um rio “…E o seu despoluído e muito mais caudaloso leito de então forneceu a todos os colonos e naturais da área ambiente fresco e salutar, copiosa variedade de peixe e inesgotável fonte de energia para matar a fome e proporcionar trabalho. São, aliás provas disso os típicos moinhos e respectivos açudes, que dominam as suas margens e que se podem considerar as primeiras fábricas da terra".

O Dr Maurício Fernandes, que além desta nos deixou várias outras obras, era membro de várias associações como, entre outras, a dos Arqueólogos Portugueses e a de Genealogia. Era também membro da Academia Internacional de Genealogia.

A Biblioteca Municipal tem ao seu dispor a Monografia e outras obras do Dr Maurício Fernandes, as quais estão à sua disposição para serem desfrutadas, nas suas maravilhosas descrições que nos fazem perder na sua leitura.

A bonomia e espírito de trabalho, a Amizade e o carinho com que sempre se dedicou também a S. João da Madeira e às nossas gentes, serão uma marca perene com que relembraremos o “Dr. Maurício” que a doença hoje levou.

  2020.06.25



 









terça-feira, 23 de junho de 2020

A IDEIA DE URBANO EM RAUL LINO: O PROJETO DA PRAÇA DE S. JOÃO DA MADEIRA

A propósito das obras na Praça Luís Ribeiro vale a pena aceder à obra "Ideia de urbano em Raul Lino: o projeto da Praça de S. João da Madeira, dissertação de Mestrado Integrado em Arquitetura,  da autoria de Ivo Júnior Rodrigues Machado, realizado em 2016 e que nos conduz através do processo evolutivo que o Centro da cidade sofreu ao longo do último século.

Raul Lino (1879-1974), conceituado arquiteto, quando é convidado a projetar a Praça de S. João da Madeira, em 1945,  surge, dos seus desenhos, uma sala de estar.

A sua visão sobre o modo de estar na cidade fascina precisamente por constituir o olhar de um arquiteto, que em pleno início do século XX, viu, com os seus próprios olhos, as transformações de uma paisagem e de uma sociedade em vertiginosa acentuação para novos ritmos de velocidade e efemeridade.

Venha saber tudo sobre o arquiteto Raul Lino, sobre a Praça Luís Ribeiro e a sua mensagem deixada aos sanjoanenses "Uma terra industrial e das mais progressivas do país (honra lhe seja feita)".

Honra para nós também pelo seu legado.


segunda-feira, 22 de junho de 2020

"O que eu ouvi na barrica das maçãs" de Mário de Carvalho

Venha conhecer a faceta de cronista de um dos mais importantes escritores da atualidade.
A obra premiada já disponível para si na receção da Biblioteca.

Sinopse:
Reconhecido como um dos mais importantes escritores portugueses da actualidade, a sua faceta de cronista passou despercebida à maior parte dos leitores; daí esta selecção das suas melhores crónicas publicadas nas décadas de oitenta e noventa do século passado no Público e no Jornal de Letras. Delas emergem o ficcionista, o cidadão, o comunicador e o memorialista, em textos que alguns diriam proféticos e, nas palavras de Francisco Belard: «testemunhos de um largo campo de assuntos, abordagens, dimensões e estilos, através de eras e lugares, sinais de um escritor que declaradamente prefere viajar no discurso e decurso do tempo e do espaço doméstico a fazê-lo em itinerários geográficos, programados e turísticos. Por tudo isto […], os leitores dos romances o vão reencontrar em mudáveis cenários e perspectivas, de outros pontos de vista, na familiaridade e na estranheza diante do seu mundo, que faz nosso.»

Críticas de imprensa
Um dos meus prazeres, ao ler um texto de Mário de Carvalho, é tropeçar em vocábulos e locuções que já só raramente vejo escritos e ainda mais raramente oiço, de viva e alta voz. Junte-se a isto uma apuradíssima e, sobretudo, impassível ironia, e eis o prazer dobrado e redobrado.
Público (4 ****)

Mais do que a qualidade da escrita — imaculada, inventiva, sempre a testar os limites do que é possível fazer com a língua portuguesa (e nunca aquém daquilo a que nos habituou em outros livros) —, surpreende-nos a acuidade do cronista na leitura de sinais que estariam talvez encobertos no momento em que escrevia, mas já anunciavam alguns dos males hoje prevalecentes, passados 20 ou 30 anos.

Expresso (4 ****)

O mesmo domínio da língua portuguesa
Emanuel Guerreiro | 10-06-2019

Tendo habituado os seus leitores e admiradores ao romance e a narrativas mais curtas, como os contos, o seu domínio criativo e a reflexão sobre o quotidiano não se perdem em textos breves como as crónicas, e continua a cativar a nossa atenção e a despertar questões.

Mário de Carvalho vence Grande Prémio de Crónica e Dispersos Literários





O escritor Mário de Carvalho foi o vencedor do Grande Prémio de Crónica e Dispersos Literários, da Associação Portuguesa de Escritores (APE), com o livro O que eu ouvi na barrica das maçãs, anunciou esta quarta-feira a organização.

O Grande Prémio de Literatura Crónica e Dispersos Literários APE/Câmara Municipal de Loulé foi atribuído por unanimidade do júri, constituído por Cândido Oliveira Martins, Carlos Albino Guerreiro e Paula Mendes Coelho, revelou a APE em comunicado.

O júri justificou a escolha deste livro de Mário de Carvalho, "O que eu ouvi na barrica das maçãs", editado pela Porto Editora, por apresentar a “plena conjugação com a linha característica do género da crónica na tradição literária portuguesa”, o que o fez destacar-se entre o “conjunto das obras apresentadas a concurso”.

“Outras obras a concurso são igualmente de grande mérito mas estão fora dos parâmetros regulamentares do prémio ou fora das características dos géneros em consideração”, acrescentou o júri.

O Grande Prémio de Crónica e Dispersos Literários, instituído pela Associação Portuguesa de Escritores, com o patrocínio da Câmara Municipal de Loulé, destina-se a galardoar anualmente uma obra em português, de autor português, publicada em livro e em primeira edição em Portugal, no ano de 2019.

O valor monetário deste galardão para o autor distinguido é de 12 mil euros. A cerimónia de entrega do prémio será anunciada oportunamente.

Em edições anteriores, este prémio já distinguiu os autores José Tolentino de Mendonça, Rui Cardoso Martins, Mário Cláudio e Pedro Mexia.