quinta-feira, 2 de maio de 2019

CLUBE DE LEITURA - ABRIL


No passado dia 30 de abril, teve lugar a sessão do Clube de Leitura, para análise e discussão do livro "Esse cabelo", primeira obra publicada pela angolana Djaimilia Pereira de Almeida (1982- ).

Este livro tem sido recomendado por grandes vultos da literatura nacional e lusófona como Bruno Vieira Amaral, João Pinto Coelho, José Eduardo Agualusa, etc.. A sua segunda obra "Luanda Lisboa Paraíso" recebeu  o Prémio Literário Fundação Inês de Castro 2018.

A jovem autora  escreve bem, numa linguagem heterogénea, umas vezes simples, outras vezes pretensiosa, um pouco desarticulada, numa sintaxe fechada, o que escurece o sentido do texto, obrigando o leitor, muitas vezes, a retroceder na leitura para um melhor entendimento.

Trata-se de um conjunto de memórias,  nitidamente autobiográficas, numa busca constante pela sua identidade, que retrata especialmente uma geração e uma época, não faltando referências musicais e culturais contemporâneas. 
O racismo, os preconceitos,  estão presentes em toda a obra e muito embora falar de cabelos seja sempre encarada como uma futilidade, “Esse cabelo” é uma metáfora, cheia de simbolismos, que marcam os ciclos da sua vida.

O 9º capítulo é o mais belo e vem condensar toda a história “de uma menina que aterrou despenteada aos três anos em Lisboa, vinda de Luanda, e das suas memórias privadas ao longo do tempo, porque não somos sempre iguais aos nossos retratos de infância; mas é também a história das origens do seu cabelo crespo, cruzamento das vidas de um comerciante português no Congo, de um pescador albino de M’banza Kongo, de católicas anciãs de Seia, de cristãos-novos maçons de Castelo Branco - uma família que descreveu o caminho entre Portugal e Angola ao longo de quatro gerações com um à-vontade de passageiro frequente. E, assim, ao acompanharmos as aventuras deste cabelo crespo - curto, comprido, amado, odiado, tantas vezes esquecido ou confundido com o abismo mental -, é também à história indirecta da relação entre vários continentes - a uma geopolítica - que inequivocamente assistimos”.

Parafraseando Elena Ferrante, numa entrevista recente  “Nunca abandono um livro, mesmo que ele não me agrade, leio-o até à última linha. Encontro sempre qualquer coisa para aprender. E entusiamo-me, talvez até de um modo excessivo, quando um livro me surpreende favoravelmente."

No caso de “Esse cabelo” viajou-se no tempo e no espaço, desta vez entre Luanda e Lisboa e por várias gerações. Regressamos também a 1957, aos Arkansas, ao tempo racismo, da luta pelos Direitos Civis nos EUA e de Elizabeth Eckford, vítima do ódio racial da multidão branca.

Este episódio simboliza uma "radiografia da sua alma", pois dentro dela, nos seus genes, encontram-se, simultaneamente, em conflito as vítimas do racismo e os supremacistas.
Embora relacione a sua "caminhada pacífica com a de Elizabeth, esse supremacista não cabe em nenhuma das definições conhecidas, embora subsista mesmo quando nada brame. Estava bem vivo no meu avô Castro, através do qual vociferava contra a "petralhada" do autocarro".

E a verdade é que nos dias de hoje ainda subsiste mesmo.
Quem nunca teve um pensamento ou exclamação supremacista? 






 
 



   

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