O
escritor, jornalista e militante do PCP, Urbano Tavares Rodrigues morreu na
manhã desta sexta-feira, no Hospital dos Capuchos, em Lisboa.
O
escritor estava internado há três dias. A notícia soube-se através da página de
Facebook "Urbano
Tavares Rodrigues - escritor" e foi publicada pela filha,
a escritora Isabel Fraga: "O meu pai acaba de nos deixar. Estava
internado nos Capuchos há três dias. Não tenho mais informações. Soube agora
mesmo." O PÚBLICO confirmou.
O
corpo de Urbano Tavares Rodrigues estará em câmara ardente a partir das 19h00
desta sexta-feira, na Sociedade Portuguesa de Autores, em Lisboa.
Numa
entrevista ao Ípsilon, em Outubro do ano passado, Urbano Tavares Rodigues
dizia: “Mereço amplamente o Prémio Camões”. A frase saiu a meio de uma
conversa sobre livros e política. Reflectia o sentimento de uma justiça por
fazer. Não era a primeira vez que deixava cair o desabafo. Fazia, então, 60
anos de obra literária e 89 de uma vida cada vez mais frágil fisicamente devido
a uma insuficiência cardíaca. Continuava a escrever e continuou a editar até
ser internado. O escritor, jornalista e activista do PCP morreu esta
sexta-feira de manhã a poucos meses de completar 90 anos.
Urbano
Tavares Rodrigues nasceu em Lisboa, a 6 de Dezembro de 1923, filho de uma
família de grandes proprietários agrícolas de Moura, Alentejo. Foi aliás
em Moura que fez a escola primária. Depois, já em Lisboa ingressou no
Liceu Camões, onde foi colega de Luís Filipe Lindley Cintra e do irmão de Vasco
Gonçalves, António.
Licenciou-se
na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa onde cursou Filologia
Românica. Desde cedo começou a militar na oposição ao Estado Novo. Isso
valeu-lhe o impedimento de trabalhar como professor. Passou pela prisão em
Caxias e foi para um longo exílio em França. Em Paris ,
conheceu alguns dos intelectuais da década de 1950, caso de Albert Camus, de
quem foi amigo e que era presença frequente nas suas conversas. Foi
professor na Faculdade de Letras, crítico literário e esteve sempre ligado ao
Partido Comunista Português.
O escritor, autor de Os Insubmissos, era amigo de Mário Soares. “É para mim uma grande e profunda tristeza o falecimento de Urbano Tavares Rodrigues, de quem fui amigo desde a minha juventude. Era um amigo íntimo e muito querido, uma pessoa com muitas virtudes”, disse esta sexta-feira ao PÚBLICO o antigo Presidente da República.
“Tivemos
divergências políticas, naturais, sobretudo porque ele a partir de uma certa
fase da vida transformou-se, tornou-se comunista. Mas quando nos víamos éramos
os amigos de sempre, tínhamos conversas óptimas, discutíamos política”,
acrescentou Mário Soares, que foi visitar o amigo há uns meses e que, por isso,
já esperava a "notícia triste".
“Nessa
altura já o tinha achado muito em baixo, fiquei convencido de que ele estava
numa fase derradeira. De qualquer maneira é sempre uma tristeza muito grande
saber da morte de um amigo querido. Um amigo que o foi até ao fim porque,
apesar das nossas diferenças ideológicas, nunca deixámos de o ser. Tínhamos
muito contacto. Era extremamente humano, dado. Estimo-o como escritor, como
homem. Estimo-o muito.”
Autor
de uma vasta obra, onde se destaca o romance, a prosa poética, o conto e a
poesia, Urbano Tavares Rodrigues era um crítico atento e presença regular nas
páginas dos jornais. Ao PÚBLICO, Manuel Alegre lembra que foi Urbano o autor do
primeiro texto publicado sobre aPraça da
Canção. “Saiu no República, em pleno fascismo”, lembra o poeta,
recordando “um grande amigo, grande camarada, um escritor que marcou o século
XX; um grande prosador que sempre tomou partido e não se fechou nunca numa
torre de marfim e que combateu pela liberdade, pela acção e pela
palavra.”
O
escritor e ex-deputado, salienta ainda a enorme atenção de Urbano Tavares
Rodrigues às novas gerações de escritores. Foi para ele que José Luís Peixoto
enviou um exemplar da edição de autor de Morreste-me, o seu primeiro livro publicado em edição de
autor. E seria Peixoto a apresentar o último título de Urbano Tavares
Rodrigues, A Imensa Boca dessa
Angústia e outras Histórias, editado em Abril passado pela D.
Quixote. “A minha mãe era leitora do Urbano. Havia muitos livros dele lá em casa. Parte da minha
formação foi feita a lê-los. Na minha adolescência encontrava ali o Alentejo
que era a minha realidade”, disse o escritor ao PÚBLICO.
Da
Amazónia, onde está a participar num festival, José Luís Peixoto lamenta a
morte do amigo, lembra a generosidade do homem que nos últimos anos tinha
“alguma mágoa por ver a vida afastar-se de si”. Sinal dessa vitalidade que
agora se manifestava apenas na escrita, lembra, Peixoto, é o filho de Urbano
Tavares Rodrigues, António. Para ele Urbano deixou uma carta. Falava muito
dela. Dizia que era a grande herança que lhe deixava. António que agora tem
sete anos, deveria abri-la aos dez anos. A mensagem é a da tolerância.
Em
2007 começaram a ser publicadas pela Dom Quixote as suas Obras Completas. Nessa
altura, Urbano Tavares Rodrigues disse ao Ípslion que era a concretização de um
sonho antigo.
A
académica Maria Alzira Seixo foi sua aluna no primeiro ano da Faculdade de
Letras de Lisboa.Contou ao Ípsilon que o professor passava por ela e dizia:
"Sabe, trago sempre comigo a pasta de dentes e o pijama.”A aluna naquela
época, finais dos anos 50, achava desconcertante o desabafo. E nesse artigo do
Ípsilon, em 2007, explicava ainda que quando, em 1958, apareceu Uma Pedrada no Charco, com que Urbano
Tavares Rodrigues ganhou o seu primeiro prémio, o Ricardo Malheiros da Academia
de Ciências, percebeu o que o seu professor lhe queria dizer: “No mesmo
dia o Urbano era chamado e às vezes preso pela PIDE [a ex-polícia
política da ditadura de Salazar].”
Fonte: http://www.publico.pt/n1602646
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