sexta-feira, 26 de julho de 2019

NOVIDADES BIBLIOGRÁFICAS E SUGESTÕES DE LEITURA








NOVIDADES BIBLIOGRÁFICAS E SUGESTÕES DE LEITURA (REVISTAS)



CLUBE DE LEITURA - JULHO


Ontem, pelas 21h00, na biblioteca municipal, decorreu mais uma sessão do Clube de Leitura de Julho com a abordagem da obra "Princípio de Karenina" de Afonso Cruz.
Foi por opinião unânime que se considerou este livro como um dos mais descarnados e concisos e ao mesmo tempo dos mais belos do escritor. Não só pela narrativa, mas pelas reflexões, pelas citações, a imagem gráfica bastante cuidada, com fotografias no início de cada capítulo e que folheando nos sugerem imagens em movimento. A leitura foi agradável, o vocabulário riquíssimo, muita subtileza e algum suspense.

Construído com frases curtas em cinco capítulos, com descrições cinematográficas, linguagem intimista e slogans poéticos como “a imperfeição conquistará o mundo”, “reconheço-te desde sempre” ou “vou até ao meu primeiro dia” e onde a narração, mais até do que o diálogo, tem peso central.

Afonso Cruz confessa que se deixou influenciar mais por filósofos do que outros escritores, mas também é notório o seu vasto conhecimento, desde a cultura e mitologia grega, filosofia, literatura. Tudo isto deambula pela sua obra. 

Princípio de Karenina, é bastante diferente dos anteriores. É o próprio Afonso Cruz que o admite: “É raro escrever livros como este, em que há uma história do princípio ao fim que não inclui outras histórias. É a história de uma personagem”.

 A obra imagina uma carta escrita por um homem à sua filha, que não conheceu. Na verdade tiveram um encontro fortuito, que foi mais um desencontro, narrando-lhe a sua vida desde a infância.

“Eu seria muito infeliz num mundo feliz. Ela seria feliz em qualquer mundo”. Assim começa o romance, numa espécie de diálogo com o início do magistral Ana Karenina, de Tolstoi, que arrancava com a famosa frase: “Todas as famílias felizes se parecem, todas as infelizes são infelizes à sua maneira”. 

 Aborda temas da atualidade, embora de forma metafórica, sobre a existência de barreiras em relação às outras culturas e à ideia do outro. Explora também o conceito de barbarie, de erguer muros, construir fronteiras, num período em que se volta a falar nelas. Também da recusa das ideias de fora, exógenas, quando na realidade todos somos feitos de uma absorção de ideias, da crescente absorção e evolução das línguas dos povos. A diversidade é que dá a mistura do que somos hoje.
Erguer muros não é uma forma de segurança, mas de uma prisão, simplesmente por medo do desconhecido. Mas o estrangeiro, o outro, já está presente, sem qualquer possibilidade de retorno e o autor faz-nos perceber isso quando nos conta que “Depois das batatas e das bactérias e do amor e da irresponsabilidade e da ida à praia e das conchas, comecei a encontrar-me cada vez com mais assiduidade com esse tal estrangeiro e a perceber que ele nos envolve e se mistura nas nossas vidas sem que nos apercebamos sequer da sua presença, apesar do tonitruante e penetrante e inescapável: a cadela Chihuahua que corria pelos corredores era de raça mexicana e o seu nome, Gina, devia-se a uma atriz italiana (Lollobrigida); o café vinha do Oriente ou de Timor ou do Brasil ou da Colômbia; os sapatos do meu pai eram italianos; as nuvens traziam dentro delas gotas de mares distantes; os livros da nossa biblioteca eram maioritariamente assinados por gregos e romanos; as colónias das tias eram francesas; Colónia é na Alemanha; o milho era da América do Central; o nome do salão de dança da vila era um trocadilho inglês (Coincidance; os tomates era americanos; a Bíblia era semita e Deus tinha encarnado num estrangeiro, num judeu; o latim da missa era romano, assim como os esgotos; os números eram árabe; o açúcar vinha do Brasil; o pinheiro de Natal era nórdico; os árabes trouxeram laranjas e melão; o arroz e as massas vieram da Ásia; a bolacha Maria foi criada por um padeiro inglês; o ser humano nasceu em África, o nome de Salazar era espanhol; as cartas de jogar vieram da China; a canela do arroz doce era indiana; a única verdadeiramente nativa da Europa era a couve, tudo o resto era estrangeiro, a amêndoa veio do Afeganistão, as maçãs do Cazaquistão, os pêssegos da Pérsia, o damasco não veio de Damasco mas da Arménia, a alcachofra, da Palestina; nós, todos nós, somos pó de estrelas…” .
E também as tâmaras voaram de Hong-Kong...

Afonso Cruz encaminha-nos neste romance da educação opressiva e fechada "o meu pai fez-me coxo da cabeça" até a uma abertura para o mundo e a sua consequente libertação.

É a vida de todos nós, em que a infelicidade é diversa  e a felicidade uma utopia.

No entanto, está bem presente uma mensagem de esperança e otimismo "Todos os anjos caídos serão levantados", porque a existência  é uma sucessão de etapas e há sempre a possibilidade de um novo início a cada dia porque "a  beleza concerta-nos". 

 

 
 
  








quinta-feira, 25 de julho de 2019

Afonso Cruz vence Grande Prémio de Literatura de Viagens





A biblioteca municipal já tem disponível para leitura, na vitrine de destaques, as obras de Afonso Cruz, incluindo "Jalan Jalan", premiada recentemente.

Venha sentir a importância da leitura, das viagens na sua vida e conheça o conteúdo da obra premiada. 

«Apesar da beleza da paisagem, dos campos de arroz, do verde omnipresente, dos templos hindus, dos macacos zangados, uma das melhores coisas que trouxe de Bali foi uma oferta do João, que me embrulhou e ofereceu uma palavra, talvez duas: Jalan significa rua em indonésio, disse-me. Também significa andar. Jalan jalan, a repetição da palavra, que muitas vezes forma o plural, significa, neste caso, passear. Passear é andar duas vezes. (…) Passear é o que fazemos para não chegar a um destino, não se mede pela distância nem pela técnica de colocar um pé à frente do outro, mas sim pelo modo como a paisagem nos comoveu ou como o voo de um pássaro nos tocou. É um pouco como a arte, tem o valor imenso de tudo aquilo que não tem valor nenhum. Pode não ter razão, destino, objetivo, utilidade, e é exatamente aí que reside a riqueza do passeio. Não existem profissionais do passeio. Chesterton, que era um grande apologista do amador, dizia que as melhores coisas da vida, bem como as mais importantes, não são profissionalizadas. O amor, quando é profissionalizado, torna-se prostituição.»

A obra vencedora Jalan Jalan de Afonso Cruz, editada pela Companhia das Letras, venceu por unanimidade a segunda edição do Grande Prémio de Literatura de Viagens Maria Ondina Braga, atribuído pela Associação Portuguesa de Escritores (APE).

A escolha, anunciada ontem, coube a um júri coordenado por José Manuel Mendes, e que incluiu ainda Guilherme d'Oliveira Martins, Isabel Cristina Mateus e Teresa Carvalho. “A coerência, a fluidez narrativa e a consistência de uma leitura do mundo a partir da temática da viagem de que é um intérprete privilegiado” são aspectos realçados pelo júri neste livro de Afonso Cruz.

O Grande Prémio de Literatura de Viagens Maria Ondina Braga conta com o patrocínio da Câmara Municipal de Braga e tem um valor monetário de 12.500 euros.


Nascido em 1971 na Figueira da Foz, Afonso Cruz é, além de escritor, músico (faz parte da banda The Soaked Lamb), ilustrador e realizador. Publicou em 2008 o primeiro romance, A Carne de Deus: Aventuras de Conrado Fortes e Lola Benites, ao qual se seguiu, em 2009, Enciclopédia da Estória Universal, distinguido com o Grande Prémio de Conto Camilo Castelo Branco. 
Os Livros que Devoraram o Meu Pai, A Contradição Humana, Jesus Cristo Bebia Cerveja, Para Onde Vão os Guarda-chuvas e Flores são outros títulos do autor, que nos últimos anos recebeu várias distinções, entre as quais o Prémio da União Europeia de Literatura, com A Boneca de Kokoschka, em 2012.

Fonte:https://www.publico.pt/2019/07/24/culturaipsilon/noticia/afonso-cruz-vence-premio-literatura-viagens-jalan-jalan-1881125