A
escritora norte-americana Harper Lee, que ainda no ano passado voltou a ser um
dos nomes de destaque na literatura com a publicação de Vai e Põe Uma
Sentinela, editado pela Presença, sequela da obra-mestra Mataram a
Cotovia, morreu nesta sexta-feira. Harper Lee tinha 89 anos. A notícia foi
avançada por vários jornais locais e confirmada pela editora da escritora,
a HarperCollins, ao The New
York Times.
Harper Lee tinha apenas dois livros publicados,
focados nas relações raciais no Sul dos Estados Unidos: Mataram a
Cotovia (To Kill a Mockingbird no original), publicado há
mais de cinco décadas, e Vai e Põe Uma Sentinela (Go Set a
Watchman, no original), publicado no ano passado.
Sempre discreta, Lee conseguiu, ao longo dos anos,
manter uma vida afastada da atenção mediática que Mataram a Cotovia lhe
deu. Em 1961, um ano depois da publicação da obra, a história, contada por
Scout, filha de seis anos de Atticus Finch, o advogado viúvo que defende um
negro falsamente acusado de ter violado uma mulher branca, valeu-lhe o
Pulitzer. Em 1962, foi adaptado ao cinema por Robert Mulligan num filme com o
mesmo nome e que valeu o Óscar de melhor actor a Gregory Peck no papel de
Finch. Mataram a Cotovia foi traduzido em mais de 40 línguas e
vendeu mais de 30 milhões de exemplares em todo o mundo.
“Nunca esperei alcançar nenhum tipo de sucesso
com Mataram a Cotovia”, disse em 1964 a uma rádio numa das suas
poucas entrevistas. “Estava à espera de uma morte rápida e misericordiosa nas
mãos dos críticos, mas ao mesmo tempo tinha alguma esperança de que alguém
gostasse de tal forma que me incentivasse”, acrescentou ainda.
Harper Lee voltou a ser notícia no ano passado, quando
a obra que a autora julgava perdida foi publicada. O regresso teve tanto de
inesperado, mais de 50 anos depois, que se tornou num dos acontecimentos literários de 2015. Vai
e Põe Uma Sentinela foi escrito ainda antes de Mataram a Cotovia,
apesar de ser uma sequela desta última – a história acontece cerca de 20 anos
depois dos acontecimentos narrados em Mataram a Cotovia.
O manuscrito original de Vai e Põe Uma
Sentinela foi escrito por Harper Lee na década de 1950. Foi então
deixado de lado pela escritora e depois mal catalogado. Estava guardado num
local seguro associado a um dactiloscrito deMataram a Cotovia.
“A meio da década de 1950, escrevi um romance
chamado Vai e Põe Uma Sentinela. Baseia-se na personagem conhecida
como Scout já adulta e considero-o um esforço muito decente.
Na época, o meu
editor, que gostou muito dos flashbacks que o livro tinha
relativamente à infância de Scout, convenceu-me a escrever o romance do ponto
de vista de uma jovem Scout. Eu era uma escritora iniciante, por isso fiz o que
me disseram”, explicou então a escritora em comunicado, aquando do anúncio da
edição do livro.
Lee, também conhecida por Nelle para aqueles que lhe
são próximos, nasceu em 1926 em Monroeville, no estado do Alabama. Foi aqui que
cresceu, numa época de tensão racial, acontecimentos que marcariam o seu
trabalho. Em criança, passava os Verões com Truman Capote, apenas dois anos
mais velho. Eram vizinhos e ficaram amigos, com uma relação que perdurou no
tempo. Mesmo quando os dois viviam em Nova Iorque.
“O mundo perdeu uma mente brilhante e uma grande
escritora”, disse, citada pela BBC, Spencer Madrie, proprietária da Ol'
Curiosities and Book Shoppe, uma pequena livraria independente de Monroeville,
destacando “as verdades que Harper Lee deu ao mundo, provavelmente antes de o
mundo estar preparado para elas”. “Estamos agradecidos por termos tido uma
ligação a uma autora que ofereceu tanto. Faltará sempre alguma coisa em
Monroeville e no mundo em geral na ausência de Harper Lee.”
Em comunicado, o agente da autora, Andrew Nurnberg,
escreveu que o mundo perdeu “um farol de integridade”. “Ter conhecido a Nelle
nestes últimos anos não foi só um prazer absoluto mas também um privilégio
extraordinário”, acrescentou ainda, contando ter estado com Lee há seis
semanas. “Estava cheia de vida”, recordou, destacando a mente e inteligência
afiada da escritora. Citava Thomas Moore, lembra ainda.
No Twitter, multiplicam-se as homenagens à escritora.
“Descanse em paz, Harper Lee. A única coisa que não se submete à regra da
maioria é a consciência de uma pessoa”, escreveu no Twitter o CEO da Apple, Tim
Cook, citando uma conhecida frase da obra de Lee.
As causas da morte não foram reveladas.
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