A noite de
mau tempo não impediu que a sessão do Clube de Leitura acontecesse e decorreu à
volta de uma mesa, com aroma natalício, na companhia da obra “O terrorista
elegante e outras histórias” de Mia Couto e José Eduardo Agualusa.
São três deliciosas
novelas, curtas, agradáveis de ler, cheias de humor e suspense, de dois dos
autores mais populares e reconhecidos da ficção em língua portuguesa.
A escrita
dos dois é bem diferente e isso nota-se nestas novelas, onde prevalece a forte
ligação telúrica e a presença da alma africana que os une.
A escrita é simples,
com muitos neologismos, diminutivos, expressões que nos revelam a extrema criatividade
dos povos africanos e que os autores souberam aplicar magistralmente.
As
descrições são facilmente imagináveis, muito cinematográficas, ou até bastante
teatrais, com muitos diálogos.
O amor é o
fio condutor dos três contos assim como o sentido da liberdade, que são descritos nesta passagem cheia de beleza, poesia e simbologia: “Bentinho, sozinho
na sua cela, raspa com as unhas o desenho do pássaro e recolhe o pó para uma
caixinha. Faz isso lenta e minuciosamente enquanto canta. Terminado o trabalho,
lança pó para a luz, através das grades da cela.
-Vai, meu
amigo, meu pássaro. Vai e voa, livre, de volta ao céu. Enquanto houver pássaros
no céu, ninguém me poderá prender.”
«O
terrorista elegante» (escrita a quatro mãos sob um alpendre, em Boane,
Moçambique), que dá título ao livro, um angolano é preso em Portugal por
suspeita de participação em atos de terrorismo. O homem alega ser capaz de voar
e conversa com um passarinho na prisão, que parece dar-lhe as orientações
necessárias para que cumpra a sua missão.
«Venho aqui para matar.» É assim que o protagonista de «Chovem amores na rua do
matador», a segunda história, pretende finalmente fazer as pazes com o seu
passado: matando as três mulheres da sua vida.
A noite da cidade está mergulhada em caos e, enquanto o conflito se desenrola
nas ruas escuras, um estranho mascarado procura alguém para matar. Em «A caixa
preta» (tal como a anterior, a terceira história foi escrita em lugares
diferentes, trocando mensagens, um autor acrescentando o texto do outro),
gerações da mesma família são obrigadas a enfrentar os seus segredos mais bem
guardados.
As três
novelas que constituem este livro têm por base peças de teatro escritas em
conjunto pelos autores e encomendadas pelos grupos de teatro A Barraca, de
Lisboa, e Trigo Limpo - Teatro ACERT, de Tondela. Porém, depois de conversas
informais na bela e histórica cidade de Paraty, no Brasil, essas peças foram
reescritas pelos autores sob a forma de contos.
Apesar da obra
ser muito bem humorada, desintoxicante até, tem à mistura algumas tragédias da
atualidade, permitindo ao leitor uma reflexão sobre a violência, sobre a
prepotência, os interesses dos poderosos e a importância da liberdade e do amor.
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