Apesar do frio intenso e da chuva torrencial, a sessão do Clube de Leitura decorreu animada, em boa companhia, com um chá quente, perfumado, bioartesanal, Mistura da Casa (lúcia-lima, erva-príncipe, bétula e pétalas de rosa), produzido por Tiago Oliveira.
O livro abordado "Ficções" de Jorge Luís Borges, considerado um dos "monumentos literários mais deslumbrantes do século XX", embrenha-nos no universo labiríntico borgiano, num "diálogo entre a ficção e a realidade, ciência e fantasia", numa trama de "complexa metafísica inquietante".
Os temas são o "infinito, os jogos de espelhos, a cabala, os enigmas
dos detetives, o destino, o tempo, o fascínio da palavra".
Respira-se o
"espírito atemporal", universal, a infinitude do mundo das Bibliotecas, do conhecimento e a sua memória infinita.
Borges nasceu Buenos Aires em 1899 e faleceu na Suíça em 1986.
Mas, para melhor compreender a sua obra é importante saber que, após um acidente ficou cego e a partir daí o seu mundo passou a ser diferente. Para alguns estudiosos, a progressiva cegueira
de Borges ajudou-o a criar novos símbolos literários através da
imaginação, já que "os poetas, como os cegos, podem ver no escuro"
Para algumas, uma leitura difícil, estranha, inquietante e surrealista, com as histórias apresentadas de forma tão invulgar que se sentiram pouco confortáveis.
No entanto, para outras, depararam-se com um conjunto de contos, nos quais lhes surgiu um mundo fantástico, num exercício de criação artística literária de liberdade ilimitada, sem amarras, onde tudo é possível até ao infinito.
A mais curiosa, viajou de pesquisa em pesquisa e para surpresa de todas, José Saramago numa conferência em Bérgamo, faz referência a uma personagem do conto de Borges, "Análise da obra de Herbert Quain".
Saramago com a sua ironia e humor que lhe são muito comuns, delicia-nos com esta conferência da qual apresentamos este pequeno extracto.
"Ora, não é necessário ter estudado lógica intuicionista para compreender
que duas proposições contraditórias não podem ser, ambas, falsas. Como
se aplica isto a Ricardo Reis e a Herbert Quain? Aceitando, ainda que
com recurso ao paradoxo, que se um deles é autêntico, também o pode ser o
outro. Além disso, temos a prova do livro. Ao desembarcar em Lisboa, o
poeta Ricardo Reis, por esquecimento, não devolveu The god of the labyrinth à biblioteca. São coisas que estão sempre a suceder, esquecer-nos de devolver um livro….
Creio ter apresentado provas suficientes da existência real de
Herbert Quain. Faltou-me, materialmente falando, a prova que nos faria a
reconhecer em Quain essa qualidade de autor, isto é, um livro chamado The god of de labyrinth.
Lamento a minha insuficiência. E lamento mais ainda que já seja
demasiado tarde para chamar a este tribunal as testemunhas mais idóneas:
Ricardo Reis e Jorge Luis Borges.
Permita-se-me ainda um último comentário. O facto indesmentível de
Ricardo Reis ter tido em seu poder o livro de Quain autorizou-me a vir a
Bérgamo participar num colóquio sobre o autor de Ficciones.
Suponho ter ficado igualmente demonstrado que Borges não tinha uma
informação completa sobre um escritor que ele supôs ter apenas imaginado
e sobre o livro que lhe atribuiu. Devemos esperar tudo, principalmente o
que nos parecer impossível, quando heterónimos, pseudónimos e similares
se põem a viver por sua própria conta. Dividida entre o respeito que
deve ao que Borges escreveu sobre Quain e o testemunho definitivo de
Ricardo Reis, a cidade de Bérgamo não saberá, neste momento, o que
pensar. Dêmos tempo ao tempo, esperemos que as paixões acalmem. A
verdade acabará por triunfar."
Leiam na totalidade em:
Resultado do mundo infinito do conhecimento, descobrimos também que há um músico português com o nome artístico de
Herbert Quain, que podem escutar aqui:
Por hoje, vamos ficar por aqui...😊
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